Já vimos em posts anteriores principais características da terapia ABA aplicada aos TEA, além de conceitos fundamentais para entender essas características e, consequentemente, todo o conjunto de procedimentos de intervenção dentro dessa prática. O ensino de habilidades/comportamentos e a avaliação desse processo também têm peculiaridades.
No que se refere ao ensino de novos comportamentos socialmente adaptativos para o indivíduo com TEA, o analista do comportamento parte de um princípio básico: aprendizagem zero erro ou pelo menos com o mínimo possível de erros. O que isso significa? Na prática, significa que, frente a uma avaliação inicial adequada e levantamento dos repertórios que precisam ser ensinados para a criança, o analista do comportamento garante que (precisa garantir) a criança terá sempre sucesso na emissão dos comportamentos no processo de ensino. Em hipótese alguma, a criança experimentará frustração no processo de aquisição de uma nova habilidade, pelo menos não como parte da intervenção planejada.
Sei que do ponto de vista pedagógico existem diversas frentes de ensino que preconizam a possibilidade da criança cometer erros e, dessa forma, aprender também com eles. Entretanto, no contexto da terapia ABA aplicada aos TEA, essa lógica não faz sentido. Particularmente, parto do princípio de que um indivíduo diagnosticado com TEA já vivencia constantemente a frustração de não conseguir se fazer entender, não compreender de forma total as expectativas de outras pessoas, não conseguir o que quer e experimenta diferentes situações aversivas no seu dia a dia por conta das dificuldades inerentes ao diagnóstico. Por isso, um ambiente de ensino estruturado como a terapia ABA necessita ser suficientemente acolhedor, motivador e positivamente desafiador. Chamo de positivamente desafiador todas as atividades de estimulação programadas já considerando qualquer possibilidade de ajuda que a criança necessite para executar a demanda de forma adequada.
É melhor ela ter ajuda desde o início do desenvolvimento de determinada habilidade e que essa ajuda seja retirada gradativamente do que eu simplesmente colocar a demanda e deixa-la resolver sozinha, sem qualquer apoio, mesmo sabendo que é algo que ela ainda está aprendendo a realizar. Nesse sentido, hierarquias de ajudas de coordenação motora e verbal são fundamentais no processo de ensino. Por exemplo: se quero ensinar uma criança a habilidade de seguir instruções, a condição ideal de ensino é colocar a demanda – “bate palma” – e pegar as mãozinhas da criança, a ajudando a realizar o movimento. Conforme a criança aprende essa habilidade, essa ajuda passa a ser mais sutil até não ser mais necessária.
O mesmo ocorre com desenvolvimento do repertório verbal. Diante de uma demanda “você quer bolo, então, pede ______”, o profissional dá ajuda verbal total ou parcial para a criança completar a frase dizendo “bolo”. No começo, talvez a criança precise que o analista do comportamento diga a palavra inteira BOLO e ela a reproduz ponto a ponto. Com o desenvolvimento desse repertório, o esperado é que a criança comece a precisar de uma dica menos intrusiva: o profissional fala somente a sílaba inicial “BO” e a criança já fala a palavra toda. Essa “muleta” verbal passa a ser totalmente retirada quando a criança já estiver pedindo com independência.
Note que a lógica básica desse procedimento é a ajuda total logo no início do processo de ensino como forma de minimizar erros e, consequentemente, frustração durante o processo. Conforme a habilidade é desenvolvida, essa ajuda é retirada, também respeitando o ritmo da criança até que ela não precise mais de ajuda porque já emite o comportamento de forma independente. Nessa lógica, não cabe o desafio pelo erro.
Outra estratégia também muito importante, dentro da lógica da aprendizagem sem erro, é a fragmentação da tarefa ou demanda. Uma mãe muito querida que atendi no passado enviou há pouco tempo um vídeo que exemplifica esse procedimento na página do ABA fora da mesinha, no Facebook – veja o vídeo: clique aqui.
A fragmentação de tarefas é uma estratégia que pode ser aplicada em diferentes contextos e para diferentes habilidades dentro da intervenção que define a terapia ABA. Em que momento e como utiliza-la é parte inerente de um processo de avaliação adequado àquela criança.
Sobre avaliação, diferentemente do que conhecemos no senso comum (geralmente aquelas escolares, com notas atribuídas a desempenhos em um momento específico do aluno), a avaliação contínua na terapia ABA leva em conta o desempenho da criança em cada programa e estimulação. Entretanto, o olhar para esse desempenho é um caminho para examinar a eficiência e eficácia do currículo de ensino proposto para aquela criança. Em vez de dizer que a criança não está conseguindo aprender uma habilidade específica, o analista do comportamento verifica o que precisa ser modificado nos procedimentos de ensino dessa habilidade. Os registros e os gráficos resultantes deles têm a função de evidenciar o desempenho da criança dentro de um programa de aprendizagem específico como forma de avaliar os efeitos do programa sobre o desenvolvimento da habilidade.
Por isso, os registros são tão importantes. Eles são a medida e fonte mais direta de avaliação da própria terapia ABA e o quanto ela efetivamente está planejada e individualizada para a criança. Desconfie de qualquer terapia que se diga ABA se não houver registro para quase tudo que é programado como intervenção. São dados produzidos pelos registros que dão suporte para um planejamento adequado das melhores estratégias de condução do processo. Obviamente que é impossível garantir registro em 100% das situações vivenciadas pela criança. Mas precisamos garantir uma amostra mínima suficiente.
Espero ter ajudado um pouco na compreensão das características desse tipo de terapia. Até próximas publicações.
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